Coordenador de Comunidade Terapêutica: A Missão
Trago aqui, alguma abordagem, sobre este trabalho. Primeiro, vamos entender o funcionamento de uma Comunidade Terapêutica com relação ao Coordenador:
Uma CT, em geral, é o braço principal, de uma Instituição, ou Associação. Abaixo, estão relacionados os principais membros, ligados diretamente ao trabalho da CT:
COORDENADOR ADMINISTRATIVO
Cuida da parte administrativa, relações públicas e de logística da CT, integrada com a Instituição como um todo.
COORDENADOR GERAL
Coordena os trabalhos na CT, as diretrizes deste, as prioridades, revisão e adaptação do programa terapêutico, "ponte" entre os demais membros administrativos e equipe técnica, e coordena diretamente os demais Coordenadores e Monitores.Também trabalha com os residentes.
COORDENADORES
Em uma CT, por exemplo, com a capacidade para 20 residentes, em geral existem 2 plantões, cada qual constituído por um Coordenador, e um Monitor, que trabalham durante 9 dias consecutivos, com uma folga de 5 dias, ou 8 por 7. O Coordenador, é o responsável pelo plantão, e em última análise, toma as decisões urgentes, e estas, em sua absoluta maioria, sempre em conjunto com o Monitor, seu auxiliar. Decisões menos urgentes, são levadas às reuniões semanais ou quinzenais da equipe técnica, onde estão presentes toda a equipe técnica, Coordenadores, Monitores, Coordenador Geral, Psicólogo.
MONITORES
Tem como finalidade, auxiliar diretamente o Coordenador em uma CT, mais atuantes em campo, que na sede, e substituí-lo, em caso de necessidade, visto estarem a par, de todos os trâmites internos, e da rotina da CT.
"O trabalho de Coordenador de uma fazenda, traz mais sacrifícios, que frutos..."
Esta é uma frase correta, do ponto de vista de retorno material, e até pessoal. Há outra ótica, que vou abordar mais adiante.
Na maioria esmagadora, os Coordenadores e Monitores, são dependentes químicos, em recuperação. Como ocorre ? O residente, após o término de seu tratamento, analisados o perfil, a disposição, e o conhecimento razoável, é convidado, a participar de um estágio, que pode variar de 1, a 3 meses, cada CT, tem uma maneira diferenciada então, de aplicar este estágio. Este é um período, onde a pessoa irá experenciar, o "outro lado da moeda", e verá, se tem realmente vontade de prosseguir neste trabalho. Também, a equipe técnica irá analisar o estagiário, em todo o período. O estágio, é as vezes, um período difícil, em geral, os residentes, tendem a escolher o estagiário, como "alvo" e nele, descarregar de diversas formas, frustrações, desinteresse pelo tratamento, rebeldia, etc. A serenidade do estagiário, é testada, em muitas oportunidades. Também, será neste período, que ele começará seu aprendizado em como "lidar" de maneira terapêutica e adequada com o residente, e que irá perder sua própria postura de residente, e adquirir a postura de "Cuidador" (Coordenador, Monitor). Firmeza (postura) na hora certa, retidão, visão de cada indivíduo como sendo único, aplicar sua experiência pessoal, na tentativa de auxiliar o residente a galgar os degraus do tratamento, muitas vezes doloridos.
Muito importante, e vale salientar, que um "cego", não pode guiar outro. Existe um código ético, da febract (Federação Brasileira das Comunidades Terapêuticas), que norteia o trabalho e os procedimentos gerais de uma CT. Mas, óbvio, que se o indivíduo, trabalha com a recuperação de pessoas, pregando um programa terapêutico distinto, sua conduta fora da Instituição, a conduta social, deve ser no mínimo aceitável. Não falamos nem de regras morais e éticas pessoais, mas no mínimo, ser idôneo em sua conduta no comércio, por exemplo, não frequentar prostíbulos e outros, ou seja, estar realmente em recuperação, e ter um comportamento social condizente com aquilo que transmite aos outros.
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O Coordenador, e o Monitor, tem a função primordial, de proporcionar, um ambiente favorável ao tratamento dos residentes, e monitorá-los/auxiliá-los nas diversas atividades do cronograma interno diário da CT, além de ministrar palestrar e reuniões temáticas, a respeito dos 12 passos, prevenção a recaída, motivacionais, dentre outras possíveis. Estar presente junto às capelas (espiritualidade), e regular as demais atividade. A CT, a priori, é norteada, por meio do Regimento Interno e Normas de Convivência, toda a disciplina, é regida e aplicada por este mecanismo, comum e igualitário, com a diferença de que, cada caso é análisado separadamente, mas nunca pode ser omisso perante os demais pares.
Uma outra ótica, deste trabalho, é o ganho como ser humano. Antes, vale salientar, que para um DQ, o trabalho em uma CT, não é sinônimo de recuperação individual.
Explico: Como a grande maioria, dos que trabalham como coordenadores ou monitores, são DQ'S, com a diferença que estão há tempos, até anos, "limpos" e em recuperação, ou seja, com a sua doença "estagnada", obviamente, que também teriam que fazer, como todo DQ, sua "manutenção" pessoal (reuniões grupos de apoio, espiritualidade, e outros). Existe um grande engano, de alguns, que por estarem em contato direto com o assunto recuperação, o assunto 12 passos, e todo o ambiente de CT, sugere-se que, esta, já é uma forma de manterem-se bem, sem maiores cuidados consigo mesmos. Na verdade, o equívoco está no ponto que, a pessoa que trabalha em uma CT, trabalha com a "doença dos outros", e não com a sua, e nisto, pode esquecer de si mesmo. Mas, com toda a certeza, esta ajuda mútua, este trabalho, que é sim uma tentativa de salvar vidas, retorna com uma ganho espiritual para aquele que está verdadeiramente envolvido, o qual não tem preço, além de ser uma grande experiência pessoal.
CT Saudável e CT Doente
O trabalho em CT, é deveras importante, e delicado. Deve-se ter em mente, que está se tratando de seres humanos, e as consequências por uma dinâmica dos trabalhos errada, pode ser grave.
Alguns exemplos reais da “CT saudável” e “CT doente”(Texto de autoria de Laura Fracasso)
“CT SAUDÁVEL”
- Ao dar uma
experiência educativa a equipe considera o indivíduo que praticou o ato e
procura, através da experiência, fazer com que ele reflita sobre o ato.
Exemplo: um residente que atrasa para acordar deverá, por uma semana,
ser o “despertador” de toda a CT.
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- Sempre que possível às experiências educativas são individualizadas.
- O residente
tem liberdade para dar autoajuda a qualquer pessoa da equipe. Ex: Fui
confrontada por um residente por exceder o número da fila do almoço.
- A equipe
quando comete erros ou injustiças pratica o 9 passo de Alcoólicos
Anônimos. Exemplo de humildade concreta aos residentes. Na nossa
experiência esta postura faz com que o residente respeite ainda mais o
nosso trabalho. Diferente do que pensam algumas equipes: não podemos
porque senão perdemos o respeito de todos.
- Postura da equipe com autoridade e não autoritarismo.
- Uma residente
que não sabia nem fritar um ovo, ao ser escalada na laborterapia e
receber o apoio da equipe para uma aprendizagem social, não só aprendeu a
fazer muito bem o seu trabalho na cozinha, como deixou para outras
pessoas, como ela, um livro especial de receitas: com todas as dicas que
não encontramos nos livros normais.
- Quando algum familiar insiste, por gratidão, a dar um presente é orientado a presentear a CT e não alguém em especial.
- A equipe
trata os residentes de maneira igualitária sem distinção de raça, credo,
religioso, condição social, econômica e cultural.
- Equipe fala a mesma linguagem e demonstra postura em harmonia aos princípios da CT. Princípios acima das personalidades.
- Equipe tem uma carga horária compatível (40h) assim como folgas.
“CT DOENTE”
- Diante de um
comportamento inadequado o residente fica o dia todo na enxada. Muitas
vezes temos residentes que se “escondem” no trabalho e deixá-lo o dia
todo na enxada só força este mecanismo.
- “Por
preguiça” da equipe em observar quem está com comportamento inadequado a
experiência educativa é coletiva. Ex: Perda de atividades de lazer e
até de direitos básicos como a “mistura” da refeição.
- Cobrar valor extra para trabalhar a sexualidade dos residentes. Como? Levando-os a casas de prostituição. (um absurdo, mas que acontece)
- Residente não
tem direito a questionamentos, pois a palavra chave é aceitação.
Algumas equipes “produzem” situações para testar a aceitação do
residente. “Animal a gente adestra, ser humano a gente educa”. (Paulo
Freire) A equipe jamais comete erros. (Quanta onipotência!)
- Posturas autoritárias da equipe. (Medo de perder o controle.).
- Um residente tem uma determinada habilidade e a equipe “explora” isto prejudicando o tratamento como um todo. (muito comum)
- O residente é
utilizado para trabalhos particulares para a equipe. (Infração ao
Código de Ética da Federação Brasileira de CT`s, muito errada e equivocada postura de tratamento)
- A equipe faz
distinção entre os residentes, principalmente, na questão econômica. Se a
família do residente paga um valor alto, ele terá “direitos” especiais.
(Outra infração).
- Equipe recebe
presentes dos residentes e familiares e, muitas vezes, privilegia,
esses residentes (outra infração ao Código de Ética).
- Equipe com
pessoas inseguras que para demonstrarem poder desautorizam orientações
dadas por outros, deixando os residentes confusos. Personalidades acima
dos princípios.
- Equipe trabalha 21 dias e folga 7. Isto prejudica a saúde mental da Equipe e a relação com os residentes.
Leia também
Comunidade Terapêutica - Abordagens
Comunidade Terapêutica X Recuperação - Como e porque...
Outros artigos
O trabalho em Instituições, Clínicas, e Comunidades Terapêuticas, não para de evoluir. Novas diretrizes são lançadas, ao mesmo tempo que existe hoje uma maior fiscalização governamental sobre instalações e pessoal capacitado, para que neste trabalho de recuperação de vidas, que já possui suas próprias dificuldades e percalços, "a emenda, não saia pior que o soneto", pois como existem excelentes CT's, (em sua maioria) existem verdadeiros crimes em forma de Comunidades pelo Brasil afora. Não há ao meu ver, justificativa de qualquer espécie em ações que visem ajudar outro ser humano, se estas ações forem criminosas, imorais, ou anti-éticas. Se eu desejo fazer o bem há alguém, e utilizo de meios criminosos ou imorais, ou anti-éticos para realizar esta ajuda, este "bem" está fadado ao fracasso. Somos seres humanos, e falhos, nesta linha de pensamento, sempre a primeira vez estaria rodeada de "boas intenções", e talvez lá no fundo seriam estas até verdadeiras, mas logo, a exceção se tornaria a regra, num círculo vicioso que cresceria em espiral ascendente...
Hoje existe o envolvimento de uma gama de profissionais, como Assistentes Sociais, Psicólogos, Terapeutas Ocupacionais, Médicos Psiquiatras, Enfermeiros, etc. A figura do Coordenador, e/ou Monitor, também tem diferenciado de função, e nome, hoje em alguns locais não existe mais o Coordenador mas apenas Monitores, voltados para o acompanhamento diário dos internos. Especificamente neste locais, existem terapeutas ocupacionais, psicólogos, e assistentes sociais presentes quase que diariamente, onde a CT, não tem tamanho superior a um pequeno sítio, sendo que o gerenciamento administrativo, é feito por profissionais contratados.
Toda mudança, é bem vinda se vir a auxiliar na recuperação de vidas. Claro que nem tudo é adaptável, tudo dependerá da estrutura física, financeira, e terapêutica de cada local. Com certeza também, é válido falar, que uma Clínica ou Comunidade Terapêutica com instalações luxuosas, não é necessariamente sinônimo de recuperação, ou tratamento adequado até. Instalações adequadas, mas simples, podem e suprem as mesmas necessidades do tratamento adequado necessário, o que diferencia aí, é uma escolha pessoal ou familiar que pode ou deseja pagar por um serviço ou por instalações mais abrangentes.
O velho mito de que: "Em se querendo, qualquer lugar funciona", é também algo que mostrou-se ao longo dos anos errado. Somos seres únicos, e cada um é diferente do outro, portanto, uns adaptam-se melhor ao sistema de tratamento X, outros ao Y.
Importante é, não desistir...
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