Maior dose de ondansetrona é eficaz para tratar alcoolismo


A ondansetrona, substância comumente utilizada para evitar náusea em pessoas que estão sob quimioterapia, teve sua eficácia testada no tratamento de dependentes de álcool. Em estudo realizado no Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), o médico João Maria Corrêa Filho verificou sua ação em dose maior do que vem sendo utilizada e comprovou o retardamento do consumo de álcool, além da redução de sintomas de depressão e do desejo pelas bebidas alcoólicas. Ele também descobriu quais são os fatores que tornam o abandono do tratamento mais propício.

Preferir cerveja foi um fator associado a não desistir do tratamento, segundo a pesquisa

A ondansetrona atua como antagonista do receptor da serotonina, substância envolvida com a sensação de prazer promovida pela bebida alcoólica. Assim, “esse antagonismo faz com que o prazer que poderia sentir ao se ingerir a bebida diminua”, explica Corrêa Filho, que testou a dose de 16 miligramas (mg) por dia, usada atualmente apenas para tratamento de enjôo. Esta dosagem diária é maior do que a aplicada anteriormente – 4 microgramas a cada quilo do paciente (mcg/kg) – e surtiu efeito nos pesquisados em relação aos medicados com placebo. Os dependentes medicados com o fármaco demoraram mais a ingerir o primeiro gole de bebida alcoólica (54,7 versus 40,9 dias, em média, a partir do início do tratamento) e a ter o primeiro consumo intenso (58,4 versus 45,4 dias, em média). Além disto, a pesquisa descobriu que a dose de 16 mg testada, além de diminuir o prazer na bebida, chegou a melhorar sintomas depressivos dos testados, bem como a reduzir o desejo de consumir álcool.
 
A pesquisa foi feita de 2007 a 2010 com 102 alcoolistas, com idade entre 18 e 60 anos, que buscaram tratamento para a dependência no IPq. Metade deles recebeu placebo e a outra metade, as 16 mg da ondansetrona, divididas em duas doses diárias, por via oral. A medicação foi acompanhada de entrevistas sobre os sintomas depressivos e técnicas motivacionais, exames para avaliar o consumo ou não de álcool, conversas com a família e de encontros no grupo Alcoólicos Anônimos (AA). Abandono do tratamento
O abandono do tratamento foi grande e chegou a 50% dos pesquisados, taxa equivalente à média de outros tipos procedimentos de reabilitação, de acordo com a literatura médica. O pesquisador, porém, não esperava este resultado, já que o ensaio clínico foi planejado para não perder pacientes ao longo do tratamento.

Quando o dependente não ia aos encontros semanais, “a gente ligava para a família, chamava, buscava onde estava o paciente para ver se ele aparecia”, conta o médico. Após a etapa do tratamento, os resultados foram comparados a outras pesquisas com metodologias iguais feitas no mesmo grupo de estudo, o Programa Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas, mas que usavam medicamentos diferentes, como o topiramato, o acamprosato e a naltrexona.

O que se comprovou é que a porcentagem de pesquisados que concluíram o processo foi equivalente entre todas as substâncias. Corrêa Filho explica que “aparentemente, a maior adesão depende de questões pessoais e do tipo de tratamento que é ofertado, e não do efeito direto dos medicamentos avaliados”. No estudo intitulado Eficácia da ondansetrona no tratamento de dependentes de álcool e orientado por Danilo Antonio Baltieri, foi elaborada uma tipologia dos perfis de pacientes mais propícios a concluir ou não o tratamento. Os resultados mostraram que os mais suscetíveis à desistência são aqueles mais novos, que começaram os problemas por consumir bebida alcoólica precocemente, têm maior histórico familiar de alcoolismo, menos sintomas depressivos e maior gravidade do alcoolismo.

Já os fatores que individualmente aumentaram a chance da continuidade do tratamento foram a preferência pela cerveja, o tabagismo, a idade mais elevada e a assiduidade no grupo do AA.

Agência USP de Notícias - Por Laura Deus

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