Giovanni Guido Cerri: Oferecer uma chance contra a droga

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Na medicina, funciona assim: o paciente com um quadro clínico agudo, grave, com risco à vida, precisa, na maioria das vezes, permanecer internado por alguns dias, semanas ou até mesmo meses em um leito hospitalar, para receber a assistência médica indicada para seu caso.
Se melhorar e tiver condições, a pessoa tem alta. O acompanhamento passa a ser clínico-ambulatorial, com as medicações necessárias para controlar a doença, além de consultas e exames rotineiros para verificar a evolução do quadro.
É desta forma no câncer, na Aids, nas doenças do aparelho circulatório e nos casos de vítimas de derrame ou politraumatismos decorrentes de acidentes de trânsito.
Por que, então, deveria ser diferente para usuários de drogas como o crack, aqueles que, em razão de sua extrema dependência, sofrem uma série de graves problemas físicos e psíquicos que podem matá-los a qualquer momento?
A diferença, aqui, é basicamente uma: enquanto um cardiopata ou um acidentado tem, em geral, consciência de sua condição --e o medo da morte o faz aceitar cuidados médicos--, o dependente de crack precisa satisfazer sua fissura, fumar mais uma pedra, mesmo sabendo que isso pode lhe custar a vida.
Para esses casos a internação é, mais do que necessária, uma chance para que a pessoa, extremamente fragilizada pelo uso da droga e por todas as consequências nefastas ao seu organismo, possa ao menos se restabelecer, abrindo caminho para a cura de sua dependência.

Cesar Habert Paciornik/Folhapress

O governo do Estado de São Paulo está enfrentando na prática e com firmeza a epidemia de crack que se instalou no país. E do jeito mais adequado, uma vez que trata o tema sob os pontos de vista da Justiça, garantindo os direitos dos cidadãos, da assistência social, pela abordagem e acolhimento de dependentes, e, principalmente, da saúde, com forte investimento na ampliação da assistência.

O plantão judiciário que o governo do Estado disponibilizou desde o último dia 21 de janeiro no Cratod (Centro de Referência em Álcool, Tabaco e outras Drogas), com a participação da OAB, do Ministério Público e do Tribunal de Justiça, com o objetivo de dar maior celeridade às internações compulsórias e involuntárias (previstas em lei de 2001) dos casos mais graves e extremos, foi precedido do fortalecimento da rede assistencial para dependência química no Estado.

Desde 2009, foram implantados no Estado cerca de 700 leitos exclusivos para tratamento de dependentes de drogas no SUS. Desses, 209 foram criados na atual gestão do governador Geraldo Alckmin. Outros 600 deverão ser entregues até o próximo ano, na capital e interior, incluindo um moderno centro especializado em álcool e drogas ligado ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. O investimento total previsto é de R$ 250 milhões.

Não se trata, de maneira nenhuma, de apenas colocar dependentes químicos em leitos hospitalares, mas de um modelo de assistência multidisciplinar, formada por médicos, psicólogos, enfermeiros e terapeutas ocupacionais, com respeito às necessidades individuais, visando à recuperação do paciente e sua reinserção social. Depois do período de internação, é oferecida assistência ambulatorial, seja no próprio serviço ou por intermédio dos Caps-Ad (Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas).
Nem todos os casos de uso de drogas demandam internação. A maioria, ao contrário, requer seguimento clínico ambulatorial, com o imprescindível apoio da família. É dever do Estado, no entanto, assegurar todos os meios para preservar a vida dos dependentes, e o governo de São Paulo, sem medo do crack, assume este compromisso com a população.

GIOVANNI GUIDO CERRI, 59, médico e professor titular da Faculdade de Medicina da USP, é secretário de Estado da Saúde de São Paulo

Fonte-Folha de São Paulo

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