Quase oito meses já se passaram desde que a Austrália implementou as leis mais rígidas do mundo relativas aos rótulos de pacotes de cigarros, trocando embalagens icônicas por imagens explícitas de úlceras bucais, pulmões cancerosos e membros gangrenados.
Embora especialistas digam que ainda é cedo para avaliar o impacto da lei sobre o consumo de tabaco, uma coisa é certa: os fumantes estão achando que o sabor dos cigarros mudou.
As queixas começaram quase imediatamente depois de a lei entrar em efeito. "É claro que não houve reformulação do produto", disse a ministra da Saúde australiana, Tanya Plibersek. "Foi apenas que, ao serem confrontadas com uma embalagem repulsiva, as pessoas deram o salto psicológico para um sabor repulsivo."
A Austrália tem estado na dianteira na exigência de inclusão de imagens explícitas nas embalagens de cigarros e afins.
Ministros da União Europeia acordaram normas exigindo que advertências de saúde contendo imagens e texto cubram 65% dos dois lados dos maços de cigarro (a exigência anterior era de 40%). As regras ainda aguardam a aprovação do Parlamento Europeu.
Nos Estados Unidos, uma lei de 2009 previu grandes avisos com imagens e texto na parte superior dos dois lados dos maços de cigarros. Mas os tribunais federais ainda estão analisando contestações apresentadas pela indústria de cigarros.
A nova lei em vigor na Austrália, que proíbe os logotipos de marca e exige que avisos de saúde cubram 75% da frente dos maços de cigarros e 90% do verso, tem por objetivo anular a atração das marcas muito conhecidas. No ano passado, a Alta Corte australiana rejeitou uma ação contestatória movida pelas empresas British American Tobacco, Imperial Tobacco, Japan Tobacco e Philip Morris Austrália, que argumentavam que a lei violava seus direitos de propriedade intelectual.
A lei das embalagens de cigarros está rapidamente se convertendo em questão controversa no comércio internacional. A Philip Morris Ásia, cuja sede fica em Hong Kong, está contestando a legislação sob os termos de um amplo acordo comercial bilateral fechado em 1993 para promover e proteger o comércio entre a Austrália e Hong Kong.
Em maio, Cuba, a maior produtora mundial de charutos finos, registrou junto à Organização Mundial do Comércio uma "solicitação de consultas" com a Austrália. A República Dominicana, Honduras e a Ucrânia já contestaram a Austrália na OMC em relação à questão.
A Japan Tobacco é a maior fabricante de cigarros da Ásia com ações nas bolsas. No final de junho, a empresa informou que abriu uma ação judicial contra o governo tailandês devido ao plano deste de aumentar dos 55% atuais para 85% a parte das embalagens dos maços de cigarro a ser coberta por avisos de saúde explícitos.
A questão do sabor dos cigarros ganhou destaque na tabacaria Sol Levy, em Sydney. A gerente Evelyn Platus, disse que, no caso das embalagens, a ira que ela normalmente reserva ao "Estado superprotetor" se voltou contra a indústria do cigarro."As empresas de cigarros parecem ter aproveitado a situação para fabricar seu produto em outro lugar", disse ela.
Scott McIntyre, porta-voz da British American Tobacco, rejeitou as queixas relativas ao sabor. "São os mesmos cigarros, fabricados da mesma maneira, nas mesmas fábricas australianas e pelas mesmas pessoas, como vem sendo feito há muito tempo", disse ele.
Simon Chapman, da Universidade de Sydney, disse que a reação negativa dos fumantes é um bom sinal para os antitabagistas. "É possível influenciar a percepção do sabor com a embalagem em que um produto vem", disse ele. "O exemplo mais óbvio disso é o vinho. Você desconhece a maioria dos vinhos e, para escolher um, elege aquele com boa aparência."
Fonte - Folha de São Paulo
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